quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Campanha da Fraternidade 2016: Entrevista com frei Flávio Nolêto

Nesta semana, em que se aproxima a Campanha da Fraternidade Ecumênica 2016, que tem como tema “Casa comum, nossa responsabilidade”, o SITE-OFM conversou com frei Flávio Noleto.

     Frei Flávio Nolêto, religioso irmão, fez seu noviciado na Ordem dos Frades Menores, Província do Santíssimo Nome de Jesus, em 1.990, professando os votos solenes em 1.996. Doutor em educação, cursou filosofia e teologia, é professor na Faculdade Católica de Anápolis. No último Capítulo Provincial (4 a 8 de janeiro de 2016), foi eleito Definidor e continuará coordenador geral da Rede Educacional Franciscana. Acompanhe nossa entrevista:

SITE-OFM: “Casa comum, nossa responsabilidade”: o que esta frase quer dizer para nós?

Frei Flávio: Deus nos criou para o convívio fraterno, vivência no paraíso terrestre que ele nos deixou para zelar, cuidar e amar a mãe erra e tudo que nos rodeia. Precisamos viver nesta casa comum que é o planeta Terra, que muito nos oferece de belezas naturais, alimentos, ar que respiramos, fogo que nos aquece, luz que nos alumina e a escuridão que nos favorece o descanso para no outro dia recomeçarmos sob a luz de nosso Deus. É importante nos sentirmos responsáveis por tudo que nos cerca, pois fomos criados a imagem e semelhança de Deus para dar continuidade à obra da criação.

SITE-OFM: Quais contribuições a Igreja, a Escola, a Rádio podem dar para a construção da cidadania em relação ao meio ambiente?

Frei Flávio: Nossa contribuição se torna grande quando cada um faz seu serviço com dedicação, amor e fé. A Igreja é nossa mãe e nos orienta como seguir Jesus Cristo e praticar os mandamentos que Deus nos deixou. Construir o Reino de Deus implica muitas ações em favor do cidadão, respeito pelas diferenças e anúncio da paz. Nossas escolas franciscanas têm como missão a vivência da cidadania, práticas dos valores humanos e lugar de fé, pois acreditamos que não basta formar as pessoas com conteúdos científicos, é necessário ensinar e aprender questões práticas da vida, do convívio, da solidariedade e relação com o meio ambiente. Os meios de comunicação são o lugar e o espaço privilegiado para divulgar e propagar a mensagem cristã de que Jesus Cristo sempre desejou um convívio humanizado e de amor aos mais pobres e sofredores. O tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica é essencial para que nossas rádios favoreçam o debate e o diálogo entre as diversas denominações de fé para, juntos, promovermos uma cidadania com o povo. E isso a Fundação Frei João Batista Vogel faz com o Projeto Cidadania na Praça, ao atender diversas pessoas com as parcerias nas áreas da saúde, educação, direito, música, lazer, assistência social etc. Somos sementes do reino que evangeliza ao modo de São Francisco de Assis, unindo Igreja, Escola e rádios, pois o povo tem sede de Deus e nos sentimos obrigados a continuar a mensagem de Francisco de Assis, que diz: “O Amor não é amado e a felicidade assim não se pode chegar. É preciso voltar a Jesus, o amor que eu quero amar.”. Ou seja, o amor de Deus está nos irmãos que precisamos abraçar no caminho da vida. Deus nos mostra os leprosos da sociedade, pois nossa casa comum está enferma e sofredora, requer que nossas mãos sejam estendidas para acolher e abraçar os atuais leprosos da sociedade.

SITE-OFM: Como o jovem pode se comprometer na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, frente a tantos problemas de ordem econômica, social, de justiça, educação para todos, como estamos passando no momento?

Frei Flávio: Os jovens precisam se sentir chamados para transformar este mundo. Precisam ter abertura para fazer a paz e o bem, pois ficar com os braços cruzados é sinal de omissão. Jesus chama cada um pelo nome para ser profeta de um novo Reino, onde cada pessoa se sinta comprometida com um mundo de justiça, fazendo o bem sem olhar a quem. Reconhecer que somos pobres, fracos e sofredores e unir as mãos para trabalhar no bem, implica sensibilidade para ver a dor do próximo, coragem para servir e conversão, fruto da oração e escuta atenta a Deus que fala nas dores econômicas que o povo sofre, nas injustiças que nos cerca e no interesse social pelos pobres, doentes e oprimidos.

SITE-OFM: A CF-2016 é ecumênica. Que sugestões de atividades podem os grupos de jovens de diferentes Igrejas cristãs trabalharem a partir da CF-2016?

Frei Flávio: A primeira sugestão é o diálogo. Depois, o encontro com os sofredores, o interesse pelos pobres e a busca da paz.  Tudo isso se faz de forma organizada, orante e com ações concretas na ajuda aos pobres, aos sofredores e aos fracos.  Quem deseja fazer isso, encontrará os subsídios no Manual da Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2016.

Frei Ronildo, ofm (pelo SITE-OFM)

Fonte: OFM Goiás 

Tunísia: o coração da Igreja no ritmo do povo



Padre Lhernould: “a liberdade que conquistamos é real”

 “A Igreja é para o povo, seus corações devem bater num mesmo ritmo”: quem diz é o vigário geral da arquidiocese da Tunísia, padre Nicolas Lhernould. Lembrando do Natal recentemente comemorado, “as igrejas estavam repletas” – a despeito de um atentado ocorrido no centro da capital, algumas semanas antes. Muitos amigos tunisianos vieram por curiosidade, para ver como festejamos o Natal”. Algo talvez surpreendente, considerando o que se passava na Líbia ou na Argélia, há apenas algumas dezenas de quilômetros. Na Tunísia, diz o padre Lhernould, “a situação dos cristãos é boa; não há tensões interreligiosas. As preocupações dizem respeito a todo o povo: segurança, a economia”. Mesmo assim, quando se inflamam novos protestos, motivados pela pobreza que assola principalmente as regiões interiores do país, é preciso estar atento para não se deixar seduzir pelos discursos sectários.

 A Igreja tunisiana está “à escuta de Deus e do país”, para entender como atuar nas periferias. Muita coisa mudou desde os anos 70, quando os religiosos eram convidados para os projetos de desenvolvimento educacionais e sanitários; hoje o cenário mudou e as demandas são outras. Mas o “pequeno rebanho” de católicos da Tunísia não está de modo algum acomodado. É uma igreja de imigrantes quase em sua totalidade, originados de cerca de 80 países; mas de forma alguma uma igreja de “estrangeiros”. “Consideramo-nos uma igreja de cidadãos” – enfatiza padre Lhernould -.

“Ser um cidadão não significa ter passaporte tunisiano, mas sim ser visto pelos demais tunisianos como verdadeiro membro desta sociedade”.

 Nos tantos casamentos mistos, as mulheres católicas “vivem na linha de frente os reais desafios ao diálogo e à educação dos filhos”. As dez escolas católicas do país “não são escolas para a comunidade cristã. São administradas por religiosos, mas seguem currículos definidos pelo Estado e têm uma maioria de alunos muçulmanos”. Há obras de caridade desenvolvidas em cooperação com associações muçulmanas, como o projeto de assistência a portadores de deficiências ou o de suporte a mães e gestantes adolescentes. “Estas ações conjuntas são preciosas, viabilizam grandes progressos”.

 Um provérbio tunisiano diz: “não escolha sua casa, escolha antes seus vizinhos”. “A convivência verdadeira entre as pessoas produz respeito e confiança. Esse é nosso verdadeiro tesouro. Mostramos com nossas vidas que, contrariamente aos discursos sectários, podemos trabalhar juntos pelo humano”, diz o padre Lhernould.

 Mesmo os atentados do ano passado não foram capazes de abalar essa confiança. “Muitos muçulmanos nos procuraram nas igrejas para pedir perdão. Se essa atitude parece estranha ao ocidente, na Tunísia não o é; a hospitalidade é algo sagrado para o tunisiano – quando se hospeda alguém, assume-se perante Deus a responsabilidade pelo bem-estar daquele hóspede”. Por essa razão é importante “não morder a isca do terrorismo”, completa. Os desafios políticos são internos às facções islâmicas, e não podem ser confundidos com uma oposição entre religiões ou entre ocidente e oriente. “Tanto isso é verdade que se torna cada vez mais comum que líderes muçulmanos nos convidem, Igreja, para participar dos debates e reflexões acerca destes desafios que eles enfrentam hoje – para que testemunhemos como nossa história e nossa vivência como lidamos com os mesmos desafios”.

 A nova Constituição do país – que entrou em vigor em 27 de janeiro de 2014 – busca exprimir esse equilíbrio: ao mesmo tempo que estabelece o Islã como religião oficial do Estado, protege a “liberdade de crença, de consciência e de culto”, e assegura a igualdade de homens e mulheres perante a lei. Mas, ressalta padre Lhernould, “se o direito foi capaz de promover essa revolução, no âmbito da cultura as mudanças ainda levarão tempo. Serão necessárias talvez algumas gerações para que estas conquistas se sedimentem na cultura.

“O Domingo da Misericórdia é uma ocasião especial para uma sociedade na qual invoca-se diariamente “O Clemente e Misericordioso” mais de trinta vezes em oração. É um tema que serve para nos aproximar (cristãos e muçulmanos), ainda que os conceitos de misericórdia sejam um tanto diferentes no cristianismo e no Islã. O conceito de misericórdia cristão está associado à ternura. Após os atentados recentemente ocorridos, uma das feridas deixadas nos corações de nossos irmãos muçulmanos talvez provenha de sentirem-se tratados com desconfiança. Como cristãos, é preciso que façamos tudo o que estiver ao nosso alcance para reverter esse sentimento de humilhação”.

Fonte: Aleteia