quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

ECOLOGIA E LITURGIA

Leilamar  Ribeiro                                                                                
                                      Coordenadora da Pastoral Litúrgica da Paróquia Sant’Ana

No dia 29 de novembro de 1979, o Papa João Paulo ll proclamou São Francisco de Assis “celeste padroeiro dos cultores da Ecologia”. Uma boa oportunidade para nos perguntar: afinal, o que a ecologia tem a ver com a liturgia?


Nas últimas décadas, o tema da ecologia vem se impondo com força crescente na vida cotidiana, social e política. Partindo de observação de fenômenos naturais e sociais, completada por pesquisas científicas, chegamos à desconcertante constatação: estamos destruindo o planeta, estamos acabando com o meio ambiente, estamos assim impossibilitando a continuação da vida na terra. A preocupação com o meio ambiente e o empenho ecológico, tão decisivo no momento histórico atual, tem a ver com a nossa vida de fé. Afinal, professamos a fé no Deus Criador do céu e da terra, no Filho redentor e no Espírito Santo criador e vivificador de todas as coisas. Deus fez uma aliança com o gênero humano, fez-se um de nós na pessoa de Jesus de Nazaré e nos reúne num só corpo no amor, pelo Espírito do Ressuscitado que abrange e anima todo o universo, “até que Deus seja tudo em todos”. Sendo a liturgia expressão ritual de nossa fé, celebração do mistério pascal de Jesus Cristo, “cume para a qual tende a ação da Igreja e fonte donde emana toda a sua força” (SC 10), ela compreende necessariamente também, entre muitas outras, uma dimensão ecológica como compromisso da aliança que assumimos com o Deus da Vida. Na Liturgia, celebramos antecipadamente, com alegria e confiança, o mundo novo, a nova terra e o novo céu, o reino de Deus entre nós. E assim recobramos ânimo pra o embate do cotidiano. “Teu nome é Senhor, maravilhoso....o céu manifesta a tua glória, com teu resplendor é revestido. Santo é o Senhor....O céu e a terra proclamam a vossa glória.” São inúmeros os textos semelhantes em várias celebrações litúrgicas nos quais cantamos a beleza da criação: nos hinos e salmos dos ofícios divinos, no “Santo” da celebração eucarística.... Reconhecemos a presença e a glória de Deus em todas as criaturas e, por isso, bendizemos, louvamos, glorificamos, damos graças e convocamos toda a natureza ao louvor de Deus, como fez também São Francisco de Assis em seu Cântico das criaturas: Louvado sejas, meu bom Senhor, pela irmã água, pelo irmão fogo, pela irmã terra..... A criação é uma dádiva, um presente maravilhoso de Deus, reflexo de sua glória e de sua grandeza, “habitat” de todas as criaturas. Podemos desfrutar, somos beneficiários. Podemos incentivar a relação da celebração com a criação ao cuidarmos do espaço litúrgico que incorpore pedras, água e outros elementos da natureza, que de preferência nos permita ver a natureza em volta, árvores ou arbustos ao redor da igreja ou capela, que as flores que colocamos para dar um ar festivo ao ambiente sejam flores ou folhagens de verdade (e não de plástico... Deus criou oi ser humano à sua imagem...e lhes disse: Sejam fecundos e multipliquem-se, cuidem da terra e de tudo o que ela contém.... Tudo nos foi dado, porém , não como donos, e sim colaboradores, chamados a “gerenciar” este mundo de Deus, conforme a meta que ela estabeleceu e que se encontra de certo modo resumido na primeira parte da oração que Jesus nos ensinou.: Santificado seja o vosso Nome, venha o vosso Reino, seja feita a vossa vontade. Não podemos separar criação do mundo e escatologia. Possibilidades da criação e justiça do Reino. Tampouco podemos considerar esta tarefa como sendo confiada a indivíduos isolados, mas à humanidade como um todo; não para o bem de uns poucos, mas de tudo e de todos, em comunhão. No rito da preparação das ofertas o pão e o vinho simboliza todas as coisas criadas. Nós bendizemos o Senhor, porque é da bondade dele que provêm tanto as forças da natureza quanto a capacidade cultural humana, e ainda mais: é por ele que se tornarão para nós o pão da vida e vinho da salvação. Sobre eles é pronunciado a epiclese, a invocação da ação transformadora do Espírito Santo, são assumidos no memorial da morte e ressurreição de Jesus Cristo, partilhados e distribuídos em comunhão, prefigurando a plena comunhão futura quando “Deus será tudo em todos”(CF 1 Cor 15,18). Na liturgia, não somente o pão e vinho, mas todos os elementos , como luz, água, óleo, fogo, ar, sopro, incenso, flores.....representam simbolicamente Jesus Cristo e o Espírito, e nos lembram sua presença atuante em toda a realidade criada. O uso respeitoso deles na liturgia nos sugere o mesmo respeito e cuidado no trato cotidiano. Também a benção litúrgica no início da refeição nos lembra que o alimento é benção de Deus, coisa sagrada para alimentar a vida, e que pede a partilha do Reino, para que todos tenham vida. Ao longo do ano litúrgico convém ressaltar a dimensão ecológica de cada tempo e festa, a interação simbólica com as estações da natureza (diferentes em cada região) e nossa participação na longa história da salvação, que tem como meta o Reino de Deus.


Fonte: Revista de Liturgia, Ione Buyst – BOFF Leonardo, Saber cuidar , ética do humano e compaixão pela terra.

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